A esteira seguia rodando e nada da minha mala aparecer. Viajo muito e já aconteceu da minha bagagem ser das últimas a chegar, mas nunca a última. Muito menos de todos os meus companheiros de voo já terem deixado o aeroporto e a esteira parar sem que minha bagagem tivesse aparecido. “Droga de conexão”, pensei, mais chateada do que preocupada. No dia seguinte teria que voltar ao aeroporto antes de embarcar num navio para uma viagem pelas ilhas gregas – uma viagem de sonho há muito planejada, e imaginada, sem perrengues, claro.
Me dirigi ao balcão de reclamações fazendo as contas das horas: o navio sai amanhã no fim da tarde, minha mala chega antes disso já que há mais de um voo diário entre Lisboa (minha conexão) e Atenas, meu destino.
O guichê de reclamações mais parecia um bazar com um atendente tentando botar ordem na fila. Num ponto mais além via-se alguns clientes que já haviam passado pelo atendimento, se acotovelando em torno de uma área cercada onde encontravam-se, amontoadas, malas e mais malas perdidas, na esperança de localizar a sua.
Chegou minha vez de falar com o funcionário. Seu inglês era péssimo, e eu, como é de se esperar, não falo grego. Apontei, numa folha plastificada que me foi apresentada, o desenho do meu tipo de mala, a mais parecida com a minha.
– Cor? – perguntou o funcionário.
– Preta. – Droga, pensei. Tinha que ser da mesma cor de noventa por cento das malas do mundo?
– Algum detalhe? – ouvi a pergunta de praxe.
– Infelizmente não – respondi, sentindo o cansaço das muitas horas de voo de São Paulo a Lisboa, de uma longa conexão, outro voo, uma espera pela mala e a fila no guichê para ser atendida.
Preenchi um formulário com meu nome, e-mail e o hotel onde pernoitaria tentando explicar que ficaria apenas uma noite antes de embarcar no cruzeiro, pedindo urgência. Não sei se me fiz entender. O olhar do funcionário me dizia que não.
– A que horas chega o próximo voo que vem de Lisboa? Minha mala deve estar nele.
O atendente não sabia dizer, chamou um outro que também não sabia, mandou que eu fosse perguntar no balcão da companhia aérea e chamou o próximo da fila dando unilateralmente por encerrado o meu atendimento.
Com cada perna pesando cem quilos me arrastei até a saída, entrei num taxi e me dirigi ao hotel. Não havia mais nada que eu pudesse fazer a não ser esperar a chegada do próximo voo no dia seguinte onde talvez – apenas talvez – minha mala estaria. A essa altura eu já me sentia, além de exausta, bastante preocupada.
Meus temores se confirmaram. Outra espera interminável com o coração aos pulos a cada mala que aparecia na esteira do voo procedente de Lisboa. Muitas pretas, mas não a minha. Sai quase chorando dali. Nova fila para ser atendida no “achados e perdidos” por um outro funcionário com um inglês também precário que me levou até o tal cercadinho de malas extraviadas. Nada. A minha não estava lá. O navio para o cruzeiro de sonhos partiria em cinco horas.
– Vamos a um shopping comprar o que você precisa, guardamos as notas e pedimos o reembolso à companhia aérea – ouvi do meu marido sem acreditar que ele falava a sério.
Como assim?! E o tempo que passei escolhendo com cuidado o que levar? Roupas, maquiagem, chinelinhos, uma sandália bonita comprada especialmente para a viagem, os looks mais caprichados separados com carinho… Eu teria menos tempo para me enfiar num taxi, me dirigir a um shopping numa cidade desconhecia com letreiros de letras estranhas numa língua incompreensível para comprar o que precisava do que havia gastado fazendo minha mala em casa. O tempo era curto para tantas providências e, paradoxalmente, preferi me sentar numa cadeira do Starbucks do aeroporto e pedir um café.
Chorei.
Nada como tomar um café em companhia de uma alma compreensiva, paciente e solidária, e chorar, para a cabeça clarear. Eu estava na Grécia, prestes a embarcar num cruzeiro pelas ilhas mais lindas, o dia estava radiante e eu tinha duas opções: ficar sentada no aeroporto esperando minha bagagem chegar num voo depois do outro, ou entrar no navio com a roupa do corpo, mais um biquíni, um chapéu, uma sandália, uma camisa e uma bermuda – isso dava tempo de comprar – e aproveitar a viagem. Escolhi a segunda, claro!
Ali mesmo, na farmácia do aeroporto, comprei protetor solar e maquiagem simples, escova, pente e xampu. Na loja do hotel paguei o preço de um rim em cinco peças básicas contando (e rezando!) com o reembolso da companhia aérea. Não dava tempo de ir a outro lugar pechinchar. Enfiei tudo numa malinha, também comprada, e me dirigi ao Pireu, o porto a dez quilômetros de Atenas, que já era usado como ancoradouro no século VII a.c. (a Grécia é pura história!) e embarquei leve – de alma e de bagagem – no navio que me levou para uma das melhores viagens da minha vida.
***
Minha mala, com tudo meu dentro, apareceu doze dias depois em Lisboa. Por onde andou acho que nunca saberei. Nada me fez muita falta.